Entrevista
Jorge Salvador

“Há pessoas que se entregam de corpo e alma para ajudar os desfavorecidos”

 “Há pessoas que se entregam de corpo e alma para ajudar os desfavorecidos”
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Jorge Salvador, sensibilizado com a triste realidade de muitas crianças em Luanda, promoveu, com a ajuda de alguns amigos, diversas acções solidárias, que culminaram com a fundação da Associação Kamba Solidário, de âmbito nacional, sem fins lucrativos, cujo lema é “ Teu gesto, Meu sorriso”, em 2012. Em entrevista exclusiva ao Ongoma News, o também jornalista da revista Exame, formado em Comunicação Social pela Universidade Privada de Angola, afirma que “cada acto de solidariedade empreendido deve ter como recompensa um sorriso no rosto”. Entretanto, na conversa que mantivemos, Jorge Salvador falou-nos também de literatura, bem como sobre o exercício do jornalismo em Angola.

Descreva-nos a Associação Kamba Solidário.

A associação é uma instituição particular de solidariedade, sem fins lucrativos e constituída por um grupo de jovens, com intuito de promover acções de carácter social, mediante  entrega  de bens  de primeira necessidade e meios  de sustento, com vista  a assistir às populações carentes.

O que esteve na base da criação da associação?

Desde muito cedo, tive a oportunidade de viver com o escritor e meu padrinho Jorge Macedo, já falecido, que me incutiu esse espírito solidário. É assim que, quando comecei a trabalhar, tirava sempre algum dinheiro do meu salário para realizar acções solidárias, como a ajuda no Beiral e Natal solidário em frente ao Nzinga Mbande. Posteriormente, senti a necessidade de convidar mais pessoas para fazerem parte deste trabalho de voluntariado. Foi assim que  eu decidi criar o projecto. Fomos tendo uma dimensão muito grande e  sentimos a necessidade de   trabalhar de forma legal. É assim que criámos então a associação Kamba Solidário, ou seja, deixou de ser projecto, passou a ser associação  e, hoje, graças a Deus, temos núcleos  em Benguela, Malanje, Cabinda , Cuanza Norte e Zaire . [Portanto ], é uma associação de  âmbito nacional e aberta a todo o mundo , desde que se siga os regulamentos.

Acha que em Angola há solidariedade entre as pessoas?

A nossa sociedade hoje já começa a ganhar o espírito solidário. Há pessoas que se entregam de corpo e alma para ajudar os  desfavorecidos, mas ainda é muito pouco,  pelo nível de carência que se verifica no dia –a –dia. Acho que mais pessoas deviam juntar-se a esse trabalho de responsabilidade social, sobretudo as empresas, não com o intuito de auto-promover-se, mas de ajudar o desfavorecido a sair do marasmo em que se encontra.

Portanto, existem sim pessoas solidárias, prova disto é a nossa associação que realiza um grande trabalho a nível nacional e temos sido reconhecidos.

"Há necessidade de o Governo ter uma parceria mais saudável com as associações porque estas fazem muito, fazem o trabalho que é da responsabilidade do próprio Governo."

Como avalia a actuação do Executivo, particularmente do MINARS,  no que toca à resolução de problemas sociais ?

O MINARS é uma instituição que nos tem dado apoio, principalmente no que toca a transportes quando temos de nos deslocar para outras províncias do país. Porém, há necessidade de o Governo ter uma parceria mais saudável com as associações porque estas fazem muito, fazem o trabalho que é da responsabilidade do próprio Governo, que é ajudar os centros. Por isso, o Governo devia aproveitar essa força de trabalho gratuito e fazer uma parceria para que esses grupos não desistam porque há centros que não recebem nada do Governo. Essas associações surgem para cobrir esse vazio  que existe. Um dia, se essas associações pararem de trabalhar, vamos ter muitas crianças sem futuro, provocando um número elevado de delinquência e a desestruturação familiar porque, quando elas são acolhidas nos centros, estamos, no fundo, a cuidar de pessoas que no futuro vão constituir família.

"Para além do emprego que o Governo possa oferecer, é necessário ter  a capacidade de criar o seu próprio emprego, isto é, incutir na mente dos jovens  a necessidade de criação das nossas próprias  oportunidades  por causa  da escassez  de emprego."

Actualmente, Angola enfrenta diversos problemas quanto ao acesso ao emprego. Como caracteriza este aspecto?

Esta questão é um problema estrutural, não é um problema que vamos resolver do dia para a noite, mas é necessário que haja interesse dos órgãos de decisão do país. [Por isso], acho ser necessário que se dê oportunidade à juventude e que se mostre a ela que para conseguirmos um emprego, temos de ter capacidade. O que acontece hoje é que os empregos são poucos e destes poucos nem sequer são os capacitados a consegui-lo, isso provoca uma desmotivação total. Hoje, a juventude não estuda para ter conhecimento, estuda unicamente a pensar  no dinheiro  porque, na nossa realidade, estudando ou não, tendo conhecimento ou não, se  fica  no desemprego. Por isso, o Governo deve criar políticas que mostram à juventude que é possível conseguir emprego com conhecimento e com estudos que se têm. Mas também mostrar à juventude que, para além do emprego que o Governo possa oferecer, é necessário ter  a capacidade de criar o seu próprio emprego, isto é, incutir na mente dos jovens  a necessidade de criação das nossas próprias  oportunidades  por causa  da escassez  de emprego. Entretanto, actualmente, os jovens, com boas iniciativas de negócio, não conseguem ter  acesso a um financiamento. Quantas empresas que conhecemos recebem financiamento e depois morrem? É um problema estrutural, que é decorrente da falta de boas políticas por parte do Governo.

Por isso, é necessário a diversificação da economia, a aposta na agricultura, que é uma área  que tem a capacidade  de empregar  um bom número  de trabalhadores  para que a carência  de emprego  não seja maior.

A produção jornalística e literária em Angola

"Um juventude que, desde tenra idade  não foi  educada  sobre a importância  da leitura,  não é  de dia  para a noite  que vai  começar a gostar de ler.”[ por isso] , “é necessário que  haja referências"

Enquanto escritor, tem uma obra no mercado, intitulada Mukandas Angolanas. Fale-nos sobre ela.

É um livro de contos que narra a história de uma menina que ficou concebida na província do Cuanza Norte, mas o rapaz alega ir para Luanda à procura de melhores condições de vida . Só que, depois, o jovem desapareceu e a menina ficou sem saber do paradeiro dele. Durante esse período, a miúda acaba por mergulhar num sofrimento porque foi abandonada em estado de mãe e há depois aí uma troca de cartas entre as famílias no Cuanza Norte e em Luanda, no sentido  de a família  em Luanda  procurar  pelo jovem. A partir daí, abordo vários problemas sociais, como a gravidez indesejada, a fuga  à paternidade, o caso  de pais  a envolverem-se  com menores, as influências  das novas tecnologias  hoje na vida  da juventude  e  as novelas brasileiras, contrariando  a educação  que as famílias  dão. Fruto desse conteúdo, recebi o convite para o livro ser reeditado em Portugal e no Brasil ainda este ano.

Essa veia artística é decorrente do jornalismo?

Esse lado nasceu porque convivi durante muitos anos com alguns escritores nossos, principalmente o escritor Jorge Macedo, meu padrinho, com quem tive a oportunidade de viver  e aprender  literatura. Ele foi uma grande influência, comecei a escrever e até hoje não parei. Tenho ainda dois livros escritos a serem publicados oportunamente. Por outro lado, admiro os escritores Mia Couto e Agualusa e nesta área não se pode correr muito, as coisas devem ser feitas paulatinamente para que as obras tenham qualidade.

Como avalia o nível de leitura por parte dos jovens hoje?

Essa juventude não lê. Se lê é por algum interesse, lêem mais os livros didácticos por recomendação do professor. Isso é uma questão de educação. Uma juventude que, desde tenra idade , não foi  educada  sobre a importância  da leitura,  não é  do dia  para a noite  que vai  começar a gostar de ler.

Então, as famílias estão a falhar?

As famílias estão a falhar… os próprios pais também não lêem. Eu, por exemplo, não comecei a gostar da leitura muito cedo, foi preciso eu viver com Jorge Macedo para começar a gostar da leitura. Então, é necessário que haja referências.

Quando as pessoas pensam que para incentivar é com a realização de feiras, não é. Isso deve ser a partir da família e da escola. Na feira, apenas  vamos comprar  um livro a bom preço. Portanto, a sociedade tem de ser reeducada, com base em valores como a importância da leitura... Os jovens não têm a capacidade de argumentação porque não gostam de ler. Por outro lado, não temos uma indústria cultural que nos possa oferecer bons livros a bom preço.

"O [jornalista] estagiário, por exemplo, não pode entregar um texto ao editor e este corrigi-lo e publicá-lo. É necessário que o estagiário receba o texto com as respectivas correcções para ver onde falhou."

Acha que o acesso ao Jornalismo devia limitar-se a pessoas com formação nessa área?

Acho que o Jornalismo é prático. Há pessoas que se formaram em Comunicação Social e não são bons jornalistas. É necessário que,  para além do Curso de Comunicação Social ou Jornalismo, se façam alguns cursos que dão a capacidade de escrever assuntos ligados, por exemplo, à economia. O jornalista tem de ter  a  capacidade de escrever sobre  tudo, mas  tem de ter formação ou conhecimento. Hoje, o jornalismo está a ser alimentado por uma classe de jornalistas  que deixa  muito a desejar  por  preferir  publicar trabalhos sem qualidade para agradar a outras pessoas. É assim que o jornalismo vai perdendo respeito [porque] a maior parte dos meios de comunicação social acabam por ser reféns das políticas do Estado ou de quem tem o poder de os financiar.

Tem acontecido ao nível do Jornalismo a transmissão de conhecimento da geração mais antiga à mais nova?

São poucos que têm essa disponibilidade para a geração mais nova, mas o nosso jornalismo ainda é carente de referências, principalmente o jornalismo televisivo.

Várias vezes, vejo editores a ralharem estagiários de uma maneira pouco agradável porque o editor não é formado, é uma pessoa com larga experiência na área e demonstra ciúme, o que atrapalha o bom desempenho do estagiário. Precisamos de jornalistas  que nos  sirvam  de referência, ajudando-nos a crescer. O estagiário, por exemplo,  não pode  entregar  um texto  ao editor  e este corrigi-lo e publicá-lo. É necessário que o estagiário receba o texto com as respectivas correcções para ver onde falhou.

Que avaliação faz do desempenho do Sindicato de Jornalistas Angolano?

Acho que o sindicato devia ter um papel fundamental, no sentido de defender os interesses dos jornalistas. Ele tem feito alguma coisa quanto a esse aspecto, porém,  há circunstâncias em que o mesmo não tem voz, ou seja, não consegue fazer valer os seus propósitos por  causa dos interesses políticos. Acho que o SJA é mais um órgão que existe para cumprir formalidade. Os jornalistas precisam de ter mais voz, de ter essa capacidade de não serem reféns de outros interesses, quando isso deixar de acontecer aí sim o sindicato  terá uma palavra a dizer. Deste modo, o  papel do sindicato não deve cingir-se apenas na aparição na TV a defender alguma coisa, deve ser algo prático [porque] há muitos jornalistas que são injustiçados  ao nível das suas empresas, há jornalistas sem seguro de saúde. É a isso que o sindicato deve prestar atenção, mas, para  este  trabalhar, é necessário os jornalistas  integrarem-se  no sindicato, cumprirem com as suas obrigações, pagarem as quotas para depois exigirem os seus direitos.

Outras sobre a associação Kamba Solidário

A associação fez,  em Janeiro deste ano,5 anos de existência, desde que foi criada  e  procura  estabelecer  parceria  social , solidária  e sustentável com os demais  intervenientes , tais como empresas, Estado  e sociedade civil, tendo  como   missão incentivar e promover  acções  sustentáveis  com vista a proporcionar  um ambiente  social  e espiritual  saudável às pessoas  carentes.

A associação definiu alguns princípios  orientadores  e garante  de uma actuação  em conformidade  com a  sua   identidade, tais como: qualidade, proactividade, sustentabilidade, trabalho em equipa, solidariedade inclusiva, ética e transparência.

Alguns projectos  constituem as actividades rotineiras  da associação: educArte (artes e ofícios), Kuelela(grandes entregas e entregas relâmpagos), saúde  sorriso(consultas) , Natal solidário, entre outros.

 

 

 

 

 

 

 

 

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Venâncio Chambumba

Jorge Salvador, sensibilizado com a triste realidade de muitas crianças em Luanda, promoveu, com a ajuda de alguns amigos, diversas acções solidárias, que culminaram com a fundação da Associação Kamba Solidário, de âmbito nacional, sem fins lucrativos, cujo lema é “ Teu gesto, Meu sorriso”, em 2012. Em entrevista exclusiva ao Ongoma News, o também jornalista da revista Exame, formado em Comunicação Social pela Universidade Privada de Angola, afirma que “cada acto de solidariedade empreendido deve ter como recompensa um sorriso no rosto”. Entretanto, na conversa que mantivemos, Jorge Salvador falou-nos também de literatura, bem como sobre o exercício do jornalismo em Angola.

Descreva-nos a Associação Kamba Solidário.

A associação é uma instituição particular de solidariedade, sem fins lucrativos e constituída por um grupo de jovens, com intuito de promover acções de carácter social, mediante  entrega  de bens  de primeira necessidade e meios  de sustento, com vista  a assistir às populações carentes.

O que esteve na base da criação da associação?

Desde muito cedo, tive a oportunidade de viver com o escritor e meu padrinho Jorge Macedo, já falecido, que me incutiu esse espírito solidário. É assim que, quando comecei a trabalhar, tirava sempre algum dinheiro do meu salário para realizar acções solidárias, como a ajuda no Beiral e Natal solidário em frente ao Nzinga Mbande. Posteriormente, senti a necessidade de convidar mais pessoas para fazerem parte deste trabalho de voluntariado. Foi assim que  eu decidi criar o projecto. Fomos tendo uma dimensão muito grande e  sentimos a necessidade de   trabalhar de forma legal. É assim que criámos então a associação Kamba Solidário, ou seja, deixou de ser projecto, passou a ser associação  e, hoje, graças a Deus, temos núcleos  em Benguela, Malanje, Cabinda , Cuanza Norte e Zaire . [Portanto ], é uma associação de  âmbito nacional e aberta a todo o mundo , desde que se siga os regulamentos.

Acha que em Angola há solidariedade entre as pessoas?

A nossa sociedade hoje já começa a ganhar o espírito solidário. Há pessoas que se entregam de corpo e alma para ajudar os  desfavorecidos, mas ainda é muito pouco,  pelo nível de carência que se verifica no dia –a –dia. Acho que mais pessoas deviam juntar-se a esse trabalho de responsabilidade social, sobretudo as empresas, não com o intuito de auto-promover-se, mas de ajudar o desfavorecido a sair do marasmo em que se encontra.

Portanto, existem sim pessoas solidárias, prova disto é a nossa associação que realiza um grande trabalho a nível nacional e temos sido reconhecidos.

"Há necessidade de o Governo ter uma parceria mais saudável com as associações porque estas fazem muito, fazem o trabalho que é da responsabilidade do próprio Governo."

Como avalia a actuação do Executivo, particularmente do MINARS,  no que toca à resolução de problemas sociais ?

O MINARS é uma instituição que nos tem dado apoio, principalmente no que toca a transportes quando temos de nos deslocar para outras províncias do país. Porém, há necessidade de o Governo ter uma parceria mais saudável com as associações porque estas fazem muito, fazem o trabalho que é da responsabilidade do próprio Governo, que é ajudar os centros. Por isso, o Governo devia aproveitar essa força de trabalho gratuito e fazer uma parceria para que esses grupos não desistam porque há centros que não recebem nada do Governo. Essas associações surgem para cobrir esse vazio  que existe. Um dia, se essas associações pararem de trabalhar, vamos ter muitas crianças sem futuro, provocando um número elevado de delinquência e a desestruturação familiar porque, quando elas são acolhidas nos centros, estamos, no fundo, a cuidar de pessoas que no futuro vão constituir família.

"Para além do emprego que o Governo possa oferecer, é necessário ter  a capacidade de criar o seu próprio emprego, isto é, incutir na mente dos jovens  a necessidade de criação das nossas próprias  oportunidades  por causa  da escassez  de emprego."

Actualmente, Angola enfrenta diversos problemas quanto ao acesso ao emprego. Como caracteriza este aspecto?

Esta questão é um problema estrutural, não é um problema que vamos resolver do dia para a noite, mas é necessário que haja interesse dos órgãos de decisão do país. [Por isso], acho ser necessário que se dê oportunidade à juventude e que se mostre a ela que para conseguirmos um emprego, temos de ter capacidade. O que acontece hoje é que os empregos são poucos e destes poucos nem sequer são os capacitados a consegui-lo, isso provoca uma desmotivação total. Hoje, a juventude não estuda para ter conhecimento, estuda unicamente a pensar  no dinheiro  porque, na nossa realidade, estudando ou não, tendo conhecimento ou não, se  fica  no desemprego. Por isso, o Governo deve criar políticas que mostram à juventude que é possível conseguir emprego com conhecimento e com estudos que se têm. Mas também mostrar à juventude que, para além do emprego que o Governo possa oferecer, é necessário ter  a capacidade de criar o seu próprio emprego, isto é, incutir na mente dos jovens  a necessidade de criação das nossas próprias  oportunidades  por causa  da escassez  de emprego. Entretanto, actualmente, os jovens, com boas iniciativas de negócio, não conseguem ter  acesso a um financiamento. Quantas empresas que conhecemos recebem financiamento e depois morrem? É um problema estrutural, que é decorrente da falta de boas políticas por parte do Governo.

Por isso, é necessário a diversificação da economia, a aposta na agricultura, que é uma área  que tem a capacidade  de empregar  um bom número  de trabalhadores  para que a carência  de emprego  não seja maior.

A produção jornalística e literária em Angola

"Um juventude que, desde tenra idade  não foi  educada  sobre a importância  da leitura,  não é  de dia  para a noite  que vai  começar a gostar de ler.”[ por isso] , “é necessário que  haja referências"

Enquanto escritor, tem uma obra no mercado, intitulada Mukandas Angolanas. Fale-nos sobre ela.

É um livro de contos que narra a história de uma menina que ficou concebida na província do Cuanza Norte, mas o rapaz alega ir para Luanda à procura de melhores condições de vida . Só que, depois, o jovem desapareceu e a menina ficou sem saber do paradeiro dele. Durante esse período, a miúda acaba por mergulhar num sofrimento porque foi abandonada em estado de mãe e há depois aí uma troca de cartas entre as famílias no Cuanza Norte e em Luanda, no sentido  de a família  em Luanda  procurar  pelo jovem. A partir daí, abordo vários problemas sociais, como a gravidez indesejada, a fuga  à paternidade, o caso  de pais  a envolverem-se  com menores, as influências  das novas tecnologias  hoje na vida  da juventude  e  as novelas brasileiras, contrariando  a educação  que as famílias  dão. Fruto desse conteúdo, recebi o convite para o livro ser reeditado em Portugal e no Brasil ainda este ano.

Essa veia artística é decorrente do jornalismo?

Esse lado nasceu porque convivi durante muitos anos com alguns escritores nossos, principalmente o escritor Jorge Macedo, meu padrinho, com quem tive a oportunidade de viver  e aprender  literatura. Ele foi uma grande influência, comecei a escrever e até hoje não parei. Tenho ainda dois livros escritos a serem publicados oportunamente. Por outro lado, admiro os escritores Mia Couto e Agualusa e nesta área não se pode correr muito, as coisas devem ser feitas paulatinamente para que as obras tenham qualidade.

Como avalia o nível de leitura por parte dos jovens hoje?

Essa juventude não lê. Se lê é por algum interesse, lêem mais os livros didácticos por recomendação do professor. Isso é uma questão de educação. Uma juventude que, desde tenra idade , não foi  educada  sobre a importância  da leitura,  não é  do dia  para a noite  que vai  começar a gostar de ler.

Então, as famílias estão a falhar?

As famílias estão a falhar… os próprios pais também não lêem. Eu, por exemplo, não comecei a gostar da leitura muito cedo, foi preciso eu viver com Jorge Macedo para começar a gostar da leitura. Então, é necessário que haja referências.

Quando as pessoas pensam que para incentivar é com a realização de feiras, não é. Isso deve ser a partir da família e da escola. Na feira, apenas  vamos comprar  um livro a bom preço. Portanto, a sociedade tem de ser reeducada, com base em valores como a importância da leitura... Os jovens não têm a capacidade de argumentação porque não gostam de ler. Por outro lado, não temos uma indústria cultural que nos possa oferecer bons livros a bom preço.

"O [jornalista] estagiário, por exemplo, não pode entregar um texto ao editor e este corrigi-lo e publicá-lo. É necessário que o estagiário receba o texto com as respectivas correcções para ver onde falhou."

Acha que o acesso ao Jornalismo devia limitar-se a pessoas com formação nessa área?

Acho que o Jornalismo é prático. Há pessoas que se formaram em Comunicação Social e não são bons jornalistas. É necessário que,  para além do Curso de Comunicação Social ou Jornalismo, se façam alguns cursos que dão a capacidade de escrever assuntos ligados, por exemplo, à economia. O jornalista tem de ter  a  capacidade de escrever sobre  tudo, mas  tem de ter formação ou conhecimento. Hoje, o jornalismo está a ser alimentado por uma classe de jornalistas  que deixa  muito a desejar  por  preferir  publicar trabalhos sem qualidade para agradar a outras pessoas. É assim que o jornalismo vai perdendo respeito [porque] a maior parte dos meios de comunicação social acabam por ser reféns das políticas do Estado ou de quem tem o poder de os financiar.

Tem acontecido ao nível do Jornalismo a transmissão de conhecimento da geração mais antiga à mais nova?

São poucos que têm essa disponibilidade para a geração mais nova, mas o nosso jornalismo ainda é carente de referências, principalmente o jornalismo televisivo.

Várias vezes, vejo editores a ralharem estagiários de uma maneira pouco agradável porque o editor não é formado, é uma pessoa com larga experiência na área e demonstra ciúme, o que atrapalha o bom desempenho do estagiário. Precisamos de jornalistas  que nos  sirvam  de referência, ajudando-nos a crescer. O estagiário, por exemplo,  não pode  entregar  um texto  ao editor  e este corrigi-lo e publicá-lo. É necessário que o estagiário receba o texto com as respectivas correcções para ver onde falhou.

Que avaliação faz do desempenho do Sindicato de Jornalistas Angolano?

Acho que o sindicato devia ter um papel fundamental, no sentido de defender os interesses dos jornalistas. Ele tem feito alguma coisa quanto a esse aspecto, porém,  há circunstâncias em que o mesmo não tem voz, ou seja, não consegue fazer valer os seus propósitos por  causa dos interesses políticos. Acho que o SJA é mais um órgão que existe para cumprir formalidade. Os jornalistas precisam de ter mais voz, de ter essa capacidade de não serem reféns de outros interesses, quando isso deixar de acontecer aí sim o sindicato  terá uma palavra a dizer. Deste modo, o  papel do sindicato não deve cingir-se apenas na aparição na TV a defender alguma coisa, deve ser algo prático [porque] há muitos jornalistas que são injustiçados  ao nível das suas empresas, há jornalistas sem seguro de saúde. É a isso que o sindicato deve prestar atenção, mas, para  este  trabalhar, é necessário os jornalistas  integrarem-se  no sindicato, cumprirem com as suas obrigações, pagarem as quotas para depois exigirem os seus direitos.

Outras sobre a associação Kamba Solidário

A associação fez,  em Janeiro deste ano,5 anos de existência, desde que foi criada  e  procura  estabelecer  parceria  social , solidária  e sustentável com os demais  intervenientes , tais como empresas, Estado  e sociedade civil, tendo  como   missão incentivar e promover  acções  sustentáveis  com vista a proporcionar  um ambiente  social  e espiritual  saudável às pessoas  carentes.

A associação definiu alguns princípios  orientadores  e garante  de uma actuação  em conformidade  com a  sua   identidade, tais como: qualidade, proactividade, sustentabilidade, trabalho em equipa, solidariedade inclusiva, ética e transparência.

Alguns projectos  constituem as actividades rotineiras  da associação: educArte (artes e ofícios), Kuelela(grandes entregas e entregas relâmpagos), saúde  sorriso(consultas) , Natal solidário, entre outros.

 

 

 

 

 

 

 

 

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